terça-feira, 11 de novembro de 2025

22/11: DIA DO MÚSICO

O dia 22 de Novembro é uma data de proeminente relevância no panorama cultural e educacional, sendo formalmente designado como o Dia do Músico. Esta efeméride não se restringe a um mero reconhecimento profissional, mas constitui um ponto de convergência entre tradição hagiográfica, manifestação artística e a complexa tessitura da produção cultural.

A seleção desta data remonta à celebração de Santa Cecília de Roma, virgem e mártir cristã, cuja devoção se estabeleceu nos primórdios da Igreja. A associação de Santa Cecília à arte musical foi consolidada e institucionalizada em 1594, quando o Papa Gregório XIII a proclamou oficialmente a Padroeira dos Músicos. O referencial simbólico para esta patronagem reside nas narrativas que descrevem a mártir cantando louvores a Deus ("Cantantibus organis, illa in corde suo soli Domino decantabat") mesmo em meio ao seu martírio. Este ato de persistente devoção sonora estabeleceu-a como o ícone da fé inabalável manifestada através da melodia, conferindo à data um profundo significado para a classe musical.

Em uma perspectiva contemporânea e acadêmica, o Dia do Músico direciona a reflexão para o papel multifacetado do musicista como agente cultural e intelectual: 
  • Agente de Patrimônio: O musicista é o principal transmissor do patrimônio imaterial, atuando na interpretação de obras históricas e na criação de repertórios vanguardistas. Ele é fundamental na preservação e na evolução das tradições musicais.
  • Educação Musical e Cognição: A formação em Artes Musicais, ministrada em conservatórios e universidades, sublinha a alta complexidade técnica e teórica da profissão. O educador musical, em particular, desempenha um papel crucial no desenvolvimento cognitivo, motor e socioemocional de indivíduos em diversas faixas etárias.
  • Produção Estética e Social: O profissional da arte sonora contribui diretamente para a produção estética da sociedade, operando em esferas que vão desde a composição erudita até a produção fonográfica de massa. Sua atuação é vital para a coesão social e para a crítica cultural, fornecendo a "trilha sonora" para a experiência humana.

O dia 22 de Novembro é o momento de refletir sobre a música e a contribuição fundamental dos músicos. É um momento oportuno para que a comunidade acadêmica e as instituições culturais reavaliem e fomentem políticas de apoio e reconhecimento à arte sonora, garantindo a sustentabilidade e a excelência dos estudos em Musicologia, Composição e Performance.


sexta-feira, 24 de outubro de 2025

domingo, 5 de outubro de 2025

O Galope da Imaginação: "Cavalo de Flecha" na Infância Nordestina e na Obra de Egildo Vieira


A ligação entre a brincadeira do "Cavalo de Flecha" com a macambira e a música homônima de Egildo Vieira é a materialização perfeita da busca pela arte erudita que bebe na fonte da cultura popular nordestina.

Egildo Vieira (1947–2015), flautista e ex-integrante do Quinteto Armorial, era mestre em traduzir o sertão em música e instrumentos. A sua composição "Cavalo de Flecha" é um exemplo vívido dessa ponte cultural.

O Encontro do Lúdico Popular com a Arte Armorial

A associação entre a brincadeira e a música se dá em três níveis: o simbólico, o rítmico e o instrumental.

1. Nível Simbólico: A Temática do Sertão

Assim como a brincadeira é uma reinterpretação da vida rural (o cavalo do vaqueiro, a caça do arqueiro) usando recursos da Caatinga (a haste floral da macambira), a música de Egildo Vieira faz o mesmo no campo sonoro.

A obra "Cavalo de Flecha" é classificada no estilo Romance e Galope, buscando inspiração nas toadas de cantadores, nos cocos e no ritmo das cavalhadas e dos romances medievais que se mantiveram vivos no Nordeste.

A música evoca a força do cavalo (o galope ritmado) e a velocidade da flecha (a precisão melódica), traduzindo em arte erudita a simplicidade da corrida da criança pelo quintal com sua haste de macambira.

2. Nível Instrumental: O Ariano e os Materiais Rústicos

A peça é notável por ser frequentemente executada no Ariano, um instrumento inventado pelo próprio Egildo Vieira, em homenagem a Ariano Suassuna. O Ariano é um dos pontos mais fortes de conexão com a brincadeira:

Elemento da Brincadeira Elemento da Música Conexão
Haste da Macambira Instrumentos de Egildo Ambos utilizam materiais naturais e rústicos da região (taquaras, cabaças, quenga de coco) para criar arte.
Brinquedo Feito à Mão Ariano (Instrumento Inovador) Representam o saber-fazer tradicional (luthieria rústica) levado à excelência artística.

O Ariano é um instrumento de cordas baseado no Marimbau e utiliza cabaças como caixa de ressonância. Ele confere à música um timbre singular, profundo e percussivo, que reforça o caráter regional e rústico da composição.

3. Nível Rítmico: O Romance e o Galope

A estrutura da música em "Romance e Galope" reflete o movimento dual da brincadeira:

  • Romance: Traz a melodia e a narrativa épica, lembrando as histórias de cavalaria e bravura (o cavaleiro).
  • Galope: É a parte mais essencialmente percussiva da música, simbolizando o ritmo da corrida do cavalo e, metaforicamente, o pique da criança a brincar. O ritmo vibrante do Ariano e da percussão criada por Egildo (também com materiais rústicos) reproduz a cadência do galope do animal pelo sertão.

Assim, "Cavalo de Flecha" é um ciclo completo que celebra a cultura material e a imaginação infantil do Nordeste, elevando um simples brinquedo feito da planta da Caatinga a uma composição de arte sonora, conforme o ideal armorial.

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Macambira-de-flecha é um termo popular e regional, sem validade botânica, que se refere à haste floral seca e resistente da planta macambira (gênero Bromélia, comum no Nordeste do Brasil), quando esta haste é empregada por crianças na fabricação artesanal de brinquedos, como flechas ou o "cavalo" de uma brincadeira. O termo destaca a função lúdica e a utilização prática dessa parte específica da planta na cultura infantil do sertão.

sábado, 23 de agosto de 2025

UMA RIVALIDADE DOURADA: CORNET (PISTOM) VS. TROMPETE



A palavra pistom é frequentemente usada como um sinônimo para o cornet ou cornetim, que na língua francesa é chamado de cornet à pistons (corneta de pistões).

O cornet é um instrumento de sopro da família dos metais, assim como o trompete. A grande diferença é o formato do tubo: o trompete tem uma tubagem mais cilíndrica; o cornet tem uma tubagem mais cônica.

Essa diferença no formato do tubo dá ao cornet um som mais suave, menos brilhante e mais fácil de tocar que o do trompete, especialmente nas notas mais graves.  Em algumas regiões e épocas, o termo pistom se referia especificamente ao cornet, que era muito popular nas bandas de música e orquestras. No Brasil, historicamente, a palavra pistom foi usada para ambos os instrumentos.

Uma Rivalidade Dourada: Cornet (Pistom) vs. Trompete

Por décadas, o mundo da música foi palco de uma rivalidade acirrada entre dois dos mais nobres instrumentos de metal: o cornet e o trompete. A disputa, que se desenrolou no final do século XIX e início do século XX, não era apenas sobre qual soava melhor, mas sobre qual era o verdadeiro rei das bandas de concerto.

O cornet era o instrumento preferido para a maioria das bandas. Seu som mais suave e a agilidade nas passagens rápidas o tornavam ideal para as melodias líricas e solos virtuosísticos das marchas e dobrados.

O trompete, por outro lado, ainda era visto por muitos como um instrumento mais rude, com som mais forte e penetrante, geralmente usado para fanfarras e na orquestra sinfônica.

A Preferência de Herbert L. Clarke

Herbert L. Clarke, um dos maiores cornetistas da história, era um defensor ferrenho do cornet. Ele acreditava que o trompete era inadequado para o papel de solista e que seu som era menos expressivo. Embora ele tenha tocado trompete em orquestras sinfônicas em alguns momentos de sua carreira (incluindo na Filarmônica de Nova York), ele via o cornet como o instrumento superior para as exigências técnicas e expressivas das bandas de concerto.

Essa preferência de Clarke, um dos músicos mais influentes de sua época, cimentou ainda mais o lugar do cornet nas bandas americanas por muitos anos.

O Cornet: O Rei Indiscutível das Bandas

No auge de sua popularidade, o cornet, ou como era popularmente chamado no Brasil, o pistom, era a voz principal das bandas de música. A maioria dos virtuoses da época, como o lendário Herbert L. Clarke, não escondia seu desdém pelo trompete, que ele considerava um instrumento grosseiro e pouco refinado para os solos complexos que ele executava.

A preferência não era por acaso. O cornet tem uma tubagem mais cônica (estreita no início e mais larga no final), o que lhe confere um som mais suave, redondo e lírico. Além disso, seu formato o tornava mais ágil para passagens rápidas e melodias fluidas, características essenciais nas marchas, valsas e polcas que dominavam os repertórios das bandas.

Para os seus defensores, o cornet era o instrumento perfeito para a expressão musical, a verdadeira "voz" da melodia.

O Trompete: A Fanfarra e o Futuro

Enquanto o cornet reinava nas bandas, o trompete era relegado a um papel mais secundário. Com sua tubagem mais cilíndrica, seu som é mais penetrante, forte e claro. Por isso, ele era tradicionalmente usado em orquestras para fanfarras e passagens majestosas que exigiam um brilho sonoro marcante.

A visão de que o trompete era inferior para a melodia começou a mudar no início do século XX. O surgimento de novos gêneros musicais, como o jazz, pedia um instrumento com uma voz mais cortante e um som que pudesse se destacar em um conjunto. Foi o trompete que se mostrou ideal para essa função.

Músicos como Louis Armstrong popularizaram o trompete como um instrumento de solo de uma forma que nunca havia sido vista, mostrando ao mundo sua incrível capacidade de improvisação e expressão. Ao mesmo tempo, melhorias na fabricação do instrumento o tornaram mais ágil, desafiando a antiga supremacia do cornet.

O Veredito e o Legado

A rivalidade teve um vencedor claro: o trompete. Com o tempo, ele substituiu o cornet (pistom) como o instrumento padrão na maioria das bandas e orquestras.

No entanto, a disputa não foi sobre qual instrumento era "melhor", mas sobre qual era mais adequado para as necessidades de uma era em constante mudança.


QUIZ: https://g.co/gemini/share/6d909d89b0f9

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Fonte:

Uma Rivalidade Dourada: Corneto (Pistom) vs. Trompete. https://gemini.google.com

MATTE, Jean-Luc. Typologie des instruments à embouchure. In: JEAN-LUC MATTE. [S.l.], 2011. Disponível em: http://jeanluc.matte.free.fr/articles/typologie/typologie.htm#32322. 

PAULO CASTAGNA, F. B. e. Trombetas, Clarins, Pistões e Cornetas no Século XIX e as Fontes para a História dos Instrumentos de Sopro no Brasil. Música Hodie, Goiânia, v. 5, n. 1, 2008. DOI: 10.5216/mh.v5i1.2651. Disponível em: https://revistas.ufg.br/musica/article/view/2651. Acesso em: 23 ago. 2025.



quinta-feira, 21 de agosto de 2025

QUIZ 1

Quiz Interativo

Quiz: Dia do Clarinetista

quarta-feira, 13 de agosto de 2025

13/8. DIA DO CLARINETISTA


Johann Christoph Denner: O Pai do Clarinete

Johann Christoph Denner (13 de agosto de 1655 – 26 de abril de 1707) foi um renomado fabricante de instrumentos de sopro de madeira da era Barroca, nascido em Leipzig, Alemanha. Sua família, originalmente de afinadores de trompas, mudou-se para Nuremberg em 1666, onde Denner estabeleceu sua própria oficina em 1678. Ele se tornou conhecido por sua excepcional habilidade na fabricação de instrumentos como flautas doces, oboés e fagotes, que eram muito valorizados na Europa da época.



A Invenção do Clarinete

A maior contribuição de Denner para a história da música foi, sem dúvida, a invenção do clarinete. No final do século XVII e início do século XVIII, ele trabalhou no aprimoramento do chalumeau, um instrumento de palheta simples popular na época.

O chalumeau, embora tivesse um som agradável no registro grave, era limitado em sua extensão e versatilidade. Denner, com sua expertise e curiosidade, fez modificações cruciais que transformaram o instrumento:

  1. Adição de uma chave de registro: Esta foi a inovação mais importante. Ao adicionar uma chave na parte superior traseira do instrumento, Denner permitiu que o chalumeau produzisse notas em um registro agudo, expandindo dramaticamente sua extensão sonora. Essa chave de registro, ao sobre soprar, fazia com que o instrumento saltasse uma décima segunda (intervalo de uma oitava e uma quinta), criando um novo registro sonoro.

  2. Melhorias na boquilha e na campânula: Ele também refinou o design da boquilha e fez alterações na forma do sino (campânula), contribuindo para a qualidade e projeção do som.


O Primeiro Clarinete

Estima-se que as primeiras versões do clarinete, como o conhecemos, surgiram por volta de 1700. Os primeiros clarinetes de Denner tinham geralmente duas chaves. Embora a primeira referência documentada a um clarinete seja uma fatura do seu filho Jacob Denner datada de 1710 (três anos após a morte de J.C. Denner), é amplamente aceito que Johann Christoph Denner foi o visionário por trás de sua criação.


Legado

O trabalho de Johann Christoph Denner lançou as bases para o desenvolvimento contínuo do clarinete. Seus filhos, Jacob e Johann David Denner, continuaram o legado da família na fabricação de instrumentos. A invenção de Denner abriu caminho para futuras inovações, como as de Iwan Müller e, posteriormente, do sistema Boehm, que solidificaram o clarinete como um dos instrumentos mais expressivos e versáteis na música clássica, jazz e muitos outros gêneros. Por sua genialidade e impacto duradouro, Johann Christoph Denner é justamente reconhecido como o pai do clarinete.

O sistema Boehm para o clarinete foi padronizado por Hyacinthe Klosé e Louis-Auguste Buffet.


A Origem do Sistema Boehm

O nome "Boehm" vem de Theobald Boehm, um flautista e inventor alemão que, na década de 1830, revolucionou o design da flauta transversal. Ele criou um sistema inovador de chaves e orifícios com anéis que permitia uma maior precisão na afinação e uma digitação mais fácil e lógica.


Adaptação para o Clarinete

Inspirados pelas inovações de Boehm para a flauta, o clarinetista francês Hyacinthe Klosé (professor do Conservatório de Paris) e o fabricante de instrumentos Louis-Auguste Buffet trabalharam juntos para adaptar esse sistema ao clarinete. Entre 1839 e 1843, eles desenvolveram o que hoje conhecemos como o "Sistema Boehm para Clarinete".

As principais adaptações incluíram:

  • A utilização de chaves de anel, que permitiam abrir e fechar vários orifícios com um único movimento do dedo.

  • A relocação de alguns orifícios para melhorar a afinação e a sonoridade.

  • Um sistema de digitação mais intuitivo e menos complexo, eliminando a necessidade de "dedilhados cruzados" problemáticos que existiam nos sistemas anteriores (como o sistema Müller).

O sistema Boehm se tornou o padrão na maioria dos países, exceto em algumas regiões da Alemanha e Áustria, onde o sistema Oehler ainda é popular.

Então, embora Theobald Boehm tenha criado o sistema para a flauta, foram Klosé e Buffet que o adaptaram e padronizaram para o clarinete, tornando-o o sistema dominante para o instrumento em grande parte do mundo.