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domingo, 13 de agosto de 2023

A HORA DA ELEVAÇÃO

Fonte: https://img.freepik.com

(Áudio ilustrativo produzido no programa Sibelius com o Noteperformer integrado)

Costume antigo, hoje perdido, era o de a banda tocar na elevação. Momento em que se consagra pão e vinho, marcado pela suspensão da hóstia, do cálice e o toque dos sinos. A atenção do mestre era redobrada porque os músicos geralmente estavam dispersos pela área externa da igreja após o início da missa.

Tocava-se geralmente a introdução de um dobrado. Oito compassos eram suficientes, talvez dezesseis. Dos primeiros, tocávamos a introdução do dobrado Sumaré, de Ubaldo de Abreu. O preferido era Olyntho Mattos. De autor desconhecido, esse dobrado, assim como Sumaré, foi trazido de Pão de Açúcar por mestre Bubu (1989-1991) e desde sempre costumamos chamá-lo de "Olímpio Matos". Erro só corrigido quando um copista zeloso, este que vos escreve, identificou algumas partes originais e fez cópias para todos os instrumentos com o nome corrigido. Mesmo assim, Olímpio estava bem estabelecido. Por nada perderia para Olyntho. Nem hoje, trinta anos depois.

É um pequeno dobrado de cerca de 96 compassos em Fá menor na forma AABBACC. À introdução em ritmo anacrústico de 8 compassos se segue o tema em que quatro frases se alternam por grupos de instrumentos à maneira de pergunta e resposta, antecedente e consequente. Clarinetes e trompetes seguidos por bombardino e saxofones. Trombones e trompas a contratempo. A seção B, mais festiva, também é mais breve, com 16 compassos no tom relativo maior. Retorna para a seção A, melancólica reflexiva na primeira metade, afirmativa e decidida na segunda, daí segue para a repetição da introdução, agora para a última seção (C), o Trio, novamente no tom maior. Nesse novo ambiente, o padrão rítmico a partir do 3º compasso à semelhança de habanera, com "semínima seguida de duas colcheias em um compasso binário. A primeira colcheia [...] sincopada, ou seja, acentuada no tempo fraco". Esse padrão é interrompido a 4 compassos e novamente iniciado até a batida marcial se impor no 25º compasso para concluir a seção.

A introdução de Olyntho Mattos era desafiadora para iniciantes. Aos clarinetes e trompetes que mal executavam se dava uma parte facilitada. Eram só 16 semicolcheias, porém ter que executá-las naquela velocidade marcial só na mão esquerda dum clarinete geralmente mal treinado desencorajava o novato. Trompetes nunca viram o original, até que um copista com pretensão restauradora o recuperasse, enviando as facilitadas do mestre para o arquivo morto.

Trombone, bombardino e tubas com a parte principal garantiam a execução da introdução que logo seria repetida para introduzir o Trio. As semicolcheias desafiadoras eram ornamentais. Sentia falta mesmo só quem conhecia os originais: o mestre. No final da segunda frase dos metais, os pratos estridiam potentes no contratempo, seguidos por uma batida abafada do bumbo. Então, os instrumentos graves, que brecam antes dos pratos, na nota sensível da escala, da sétima diminuta acima desciam numa escala em tercinas para clarinetes e trompetes cantarem a partir da tônica por graus conjuntos acima e abaixo, nada de intervalos de terça. Só bombardino e saxofones exploram arpejos no acorde dominante.

Até então, não conhecia nada mais dramático em música do que aquela introdução. O mais dramático nos dobrados é o "forte do baixo" dos tenores, barítonos e tubas. Mas Olyntho Mattos era de estimação.

Mais tarde, Cafau (1992-1996; 1998-2009) assumiu a banda e trouxe de Aracaju um toque cerimonial que ficou mais frequente nas elevações. Curto e ligeiro, tem estilo militar de um entusiasmo burocrático. Nem se compara à harmonia de Olyntho. 


F. Ventura (2023)