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sexta-feira, 18 de abril de 2025

A MICAREME PIRANHENSE

Carnaval fora de época, a Micareme está intimamente ligada ao calendário religioso. Tem origem no termo francês "Mi-Carême", que significa "meia Quaresma". Originalmente, na Europa, era uma celebração que marcava a metade do período da Quaresma, oferecendo um breve respiro das abstinências e jejuns. Em outras partes do Brasil, a Micareme evoluiu para a Micareta, desvinculando-se do calendário religioso e ganhando características próprias.

Na cidade de Piranhas, continua vinculada ao calendário religioso, sendo realizada exclusivamente após o final da Quaresma, com o Zé-Pereira após a malhação de Judas, no Sábado de Aleluia, primeira folia no Domingo de Páscoa e nos dois dias subsequentes.

Interessante notar como os principais eventos profanos são condicionados pelo calendário litúrgico: os shows "extra Ecclesiam" nas festas dos padroeiros, o Carnaval (três dias antes do início da Quaresma), a Micareme (três dias depois do final da Quaresma), as festas juninas, os folguedos natalinos etc.

As famílias herdeiras dos blocos tradicionais, Os Trovadores e As Borboletas, dão conta de que a micareme piranhense se iniciou na década de 1920, porém estudo feito por L. Brito (1995) revela que esses blocos nasceram para o Carnaval de 1924. Logo, não teriam sido para a Micareme. No entanto, no primeiro evento teria havido um conflito tão absurdo que ambos só retornariam quarenta anos depois, na década de 1960, agora reorganizados sob a liderança de Zé Nego e Mané Cego, dois remanescentes do evento inaugural de 1924. E nesse retorno, então, teriam iniciado a tradição do Carnaval pós-Quaresma, a Micareme.

A escritora Rosiane Rodrigues, em seu livro seminal para a nossa cultura, Piranhas: retrato de uma cidade, cita os blocos apenas uma vez, na lista dos eventos folclóricos (pág. 22). Na parte em que registra o depoimento de Miguel Arcanjo de Medeiros, ferroviário pernambucano que movimentou culturalmente a cidade de Piranhas na segunda metade da década de 1950, não há nenhuma indicação de que esses blocos classificados de folclóricos tenham atuado naquela época.

Logo, corrobora o estudo de Brito (1995) que evidencia que os blocos foram desativados após o primeiro evento e não voltaram antes da década de 1960, época da desativação da ferrovia.

Segundo Miguel Medeiros:

Passada a época natalina, vinha o Carnaval -- como todos os habitantes da orla ribeirinha são fervorosos adeptos do catolicismo, que era quase a totalidade da população, não havendo em todo o território piranhense um só templo evangélico, o lançamento dessa festa profana seria uma demonstração de idolatria, despertando seres adormecidos, paganismo latente.
Em tempos idos, surgiu em Piranhas um bloco carnavalesco com a denominação "Amantes da Folia" que poderia agora ressurgir trazendo um toque da cultura passada na arte de representar. Criei, então, a troça "Urso Amigo" que preencheu o cenário com suas figuras acompanhantes ao som de uma sanfona, bombo e triângulo, revolucionando a cidade, pelo ineditismo do "Bloco dos Mascarados", também chamados popularmente de "Caretas". 
[...] 
A Dramática liderou uma série de atividades, todas voltadas para a cultura, com participação e colaboração da sociedade, sem preconceitos de classe, cor ou credo, político ou religioso, um verdadeiro apanágio ativista de democracia social. Dispunha, na época, do material administrativo da Estrada de Ferro, com seu Almoxarifado, o que facilitava nosso trabalho. (RODRIGUES, Rosiane. Piranhas: retrato de uma cidade. Maceió: Edufal, 2012, pág. 63) 

A frase "Em tempos idos, surgiu em Piranhas um bloco carnavalesco com a denominação 'Amantes da Folia' que poderia agora ressurgir trazendo um toque da cultura passada na arte de representar" sugere que o ferroviário ignora completamente os blocos da micareme, coisa que não aconteceria se efetivamente eles estivessem ativos durante sua passagem por Piranhas a partir de 20 de outubro de 1953.

Ou se refira aos Amantes da Folia apenas no contexto das atividades da Sociedade Dramática e Recreativa Familiar, órgão da administração ferroviária, deliberadamente negando a relevância dos blocos periféricos (?) -- o que não é provável.

Esse depoimento foi dado trinta anos depois de sua atuação em Piranhas.

Após toda essa investigação baseada em estudos relativamente recentes, recorremos à tradição familiar que comemora neste fim de semana os 101 anos dos Trovadores, os 98 anos das Borboletas e os 20 anos dos Trovoletas, bloco infantil que aglutina filhos e netos dos foliões de ambos os blocos tradicionais.

Ano passado, essa folia piranhense ganhou matéria em rede nacional sob a alcunha de blocos épicos: "porque transcendem a experiência comum, marcando a história do Carnaval regional por seu impacto cultural e memórias duradouras, que se destacam por uma combinação de elementos que os elevam a um patamar lendário".


F. Ventura (2025)

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AL TV 1ª Edição. Moradores de Piranhas comemoram a Páscoa com desfile de blocos. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/12482292/

BOM DIA ALAGOAS. Bloco "Os Trovadores" completa 100 anos com festa em Piranhas. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/12481506/

BRITO, Luciano J. R. A Ordem e a Malandragem. [Trabalho na disciplina História Urbana, sob a orientação do Prof. Robert Moses Pechman, do Curso de Especialização em Planejamento e Uso do Solo Urbano, do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro -- Novembro de 1995]. Rio de Janeiro: UFRJ, 1995.

CINECLUBE DA CASA. Bloco Os Trovadores: 100 anos de glória e tradição. Documentário. 17'44". Disponível em: https://youtu.be/5LXaDRovNTA

JORNAL HOJE. Blocos Trovadores e Borboletas mantém tradição centenária e desfilam em Piranhas, AL. Disponível em: https://globoplay.globo.com/v/12482668/

JR3 Comunicação Digital. Os Trovadores: 100 anos. Documentário. 15'. Disponível em: https://youtu.be/6igZfUOIuNw

RODRIGUES, Rosiane. Piranhas: retrato de uma cidade. Maceió: Edufal, 2012.


quarta-feira, 29 de janeiro de 2025

OS TROVOLETAS (2024)


Trecho da reportagem do Jornal Hoje de 1º/4/2024 sobre os blocos épicos de Piranhas.

Os Trovoletas, idealizado pelo arquiteto urbanista e agitador cultural Álvaro Moreira, são a contrapartida infantil dos tradicionais blocos carnavalescos Os Trovadores (1924) e As Borboletas (1927) e se apresentam há cerca de 20 anos no centro histórico de Piranhas, no período da Páscoa (chamado micareme), concentrando crianças que antes saíam na última fileira dos blocos dos adultos.

Em 2024, apresentaram-se nos dias 31 de março a 2 de abril, das 17h às 20h. Dirigido por Jaci Silveira "Titi", o bloco contou com 60 componentes: 1 puxador de bloco, 3 porta-estandartes, 1 velho, 1 borboleta, 50 passistas e 5 tocadores -- 2 saxofones (Farney e Carlinhos), pandeiro (Ronildo Lobo), triângulo (Ivan) e zabumba (Marcelo).