sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

FME 30 anos


FME 30 anos

Notas para um álbum histórico


Por F. Ventura


Este ano comemoramos 30 anos de criação da Escola de Música Mestre Elísio José de Souza que, dirigida pelo mestre Bubu, viabilizou a formação da Banda de Música (atual Filarmônica) Mestre Elísio. Mais recente formação de música instrumental, esta herda a tradição de bandas na cidade de Piranhas com sua conexão mais remota às atividades do maestro José Emiliano de Souza e à Philarmonica Piranhense, no início do século 20.
Professor de ensino primário, compositor e regente, José Emiliano foi uma personalidade bem estimada nesta parte do sertão alagoano, não obstante os piranhenses hoje ignorarem seu passado ilustre. Sua atuação mantinha pontos de contato com a tradição de bandas da vizinha cidade de Pão de Açúcar, especialmente revela uma amistosa relação com o maestro de origem pernambucana Abílio Mendonça (1879-1963) – radicado naquela cidade, antes do advento do grande Mestre Nozinho (1895-1960) e a Sociedade Musical Guarany, fundada em 1918.
Uma amostra do intercâmbio que havia está registrada no periódico A Ideia (1910-1911), da cidade de Pão de Açúcar, que em junho de 1910 publica:

"PHILARMONICA PIRANHENSE
 A convite do commercio, veio abrilhantar a 
novena por este patrocinada, esta destincta 
corporação musical, regida pelo competente 
maestro José Emiliano de Souza. Após a 
novena, em que a philarmonica piranhense 
exibiu repertorio rico de lindas composições, 
foi-lhe offerecida singela manifestação por 
parte do commercio, em casa do Snr. Olegario 
Simas; orando nesta occasião em nome do 
commercio agradecido, Alvaro Machado e em 
nome da philarmonica seu regente José 
Emiliano de Souza. 
Terça-feira accompanhada até o porto pela 
marcial daqui e por grande numero de 
commerciantes, a philarmonica piranhense 
tomou passagem na “Moxotó”, deixando 
recordações, pela sympathia que soube inspirar 
em toda população daqui."

Por sua vez, o maestro da philarmonica piranhense faz publicar a seguinte nota de agradecimento:
"AGRADECIMENTO
Chamado a funcionar na 6ª noite da brilhante festividade do S. S. Coração de Jesus, cuja noite estava ao encargo do corpo commercial dessa cidade, venho pela imprensa agradecer aos dignos cavalheiros:
Alvaro Machado, Pereira Filho, Manoel Gonzaga de Campos Machado, a maneira afavel e delicada com que trataram-me, e bem assim os meus companheiros de arte. Aproveitando a opportunidade venho também agradecer aos illustres Snrs. Cel. Luiz José, Cel. Miguel Machado, Rvmo. Vigario Pe. Julio de Albuquerque e a destincta corporação musical derigida pelo habil maestro Abilio Mendonça. A todos minhas expressões vivas de sincero reconhecimento.
Piranhas, 8 de junho de 1910.
José Emiliano de Souza."

Da cidade de Penedo, o periódico A Fé Cristã (1902-1907), 5 anos antes de A Ideia, registra o que parece ser a mais antiga referência à atuação musical do maestro José Emiliano na cidade de Piranhas – pelo menos até onde a pesquisa atual pôde alcançar, haja vista que não existe o menor vestígio da produção original do compositor, partituras ou material didático de que dispunha.

"COMMUNICADO
Com relação ao exercicio mariano nos transmitiram de Piranhas as seguintes linhas:
– Com grande concurso de pessoas encerrou-se o Mez Mariano nesta villa, sendo o acto revestido do maior brilhantismo e pompa religiosa. Os habitantes de Piranhas e seus arredores affluiam desde o alvorecer, tirando longas jornadas, afim de assistirem com attenção que é peculiar aos habitantes destas plagas, à missa cantada pelo Rvmo. Pe. José Nicodemos, na qual se exhibiu a orquestra, hábil e competentemente regida pelo maestro José Emiliano, que nos deliciou com um Credo, primorosa composição sua."
(A Fe Christã, 1905)

É a esta tradição centenária que a Filarmônica Mestre Elísio se reporta quando hoje, nos 30 anos do restabelecimento da banda municipal, reverencia os mestres músicos do passado que fizeram história na cidade de Piranhas: José Emiliano de Souza, Avelino Oliveira, Manoel Vieira Ramos (Vieirinha), Elísio José de Souza, Afrânio Menezes Silva (Bubu), Cícero Francisco de Brito (Cafau), Damião Ferreira Lima e Cícero Campos de Brito. Entre estes, é preciso fazer menção especial ao Mestre Nemésio Teixeira (1904-1978), que não foi regente de banda; músico clarinetista e professor de música, ele foi responsável na década de 1950 pela iniciação musical daquele que viria revelar-se como o maior expoente musical já nascido nesta cidade: Egildo Vieira (1947-2015).




Nota: Referências aos jornais de época foram extraídas da recente pesquisa de Billy Magno (a quem agradecemos) que, focado na história dos que fizeram a música instrumental na cidade de Pão de Açúcar, tem descoberto afinidade destes com a música praticada na cidade de Piranhas no início do século, o que nos tem ajudado a revelar parte importante de nossa história.