terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Temporada (Capim, 1920)

 
(Áudio ilustrativo produzido no programa Sibelius com o Noteperformer integrado)

TEMPORADA — Dobrado de autoria desconhecida
Por Billy Magno 
Restaurado a partir das antigas partes originais encontradas no arquivo da Sociedade Musical Guarany, da cidade de Pão de Açúcar/AL, o dobrado Temporada foi muito executado, sobretudo nos anos 70 e 80 do século passado, nas procissões que a banda acompanhava sob a regência do maestro Afrânio Menezes Silva (Pão de Açúcar, 03/01/1936 - 08/12/1991), o saudoso Bubu. Esse dobrado teria sido composto na cidade de Capim, atual Olivença, conforme dá a entender o que está grafado nas cópias originais, e teve três copistas: P. Abreu (que escreveu as partes de 1. clarinete, 2. clarinete, sax soprano, piston, barítono e bombardino) e Jovino Azevedo (requinta e flautim mi bemol, 1. trombone, 2. trombone, 1. trompa mi bemol, 2. trompa mi bemol e helicon – espécie de tuba em mi bemol muito usada na época) que copiaram as partes em 18 de junho de 1920, e ainda Américo Castro Barbosa, que copiou a parte de baixo (tuba) em si bemol já em 7 de agosto de 1920, provável data em que o dobrado chegou à cidade de Pão de Açúcar.
Segundo o músico pesquisador Flávio Ventura (1978), Jovino Azevedo teve posição de destaque nas bandas daquela região e foi maestro da Filarmônica Santanense, também chamada "Aratanha", criada em 1922 para os festejos do centenário da Independência. Na banda rival, chamada "Carapeba", atuava, nessa mesma época, Pedro de Abreu. É provável que seja o mesmo "P. Abreu" que também assina as cópias do dobrado Temporada.
Sobre o terceiro copista, Américo Castro Barbosa nasceu em Pão de Açúcar em 03 de dezembro de 1903. Era irmão caçula de Manoel Victorino Filho, o Mestre Nozinho (Neópolis/SE, 17/10/1895 – Maceió/AL, 18/04/1960), e tocava clarinete na banda União e Perseverança de Pão de Açúcar (atual Sociedade Musical Guarany), onde tinha o irmão como maestro. Ele começou a carreira ainda nos primeiros anos na década de 1910. Já estava na banda em 1917, conforme atesta uma fotografia do mesmo ano. Na década seguinte vai para Maceió e mantém sua própria orquestra, a Jazz Band A. Castro, que tem ao trombone o muito jovem e futuro maestro da banda do 20.º BC, Manoel Capitulino de Castro, que virá ser o famoso maestro Passinha (Pão de Açúcar/AL, 11/10/1908 ­ Maceió, 03/06/1993).
No final dos anos 1930, [Américo] ruma para o Rio de Janeiro, então capital da república, onde faz parte da orquestra do maestro Fon-Fon (Otaviano Assis Romeiro — n. Santa Luzia do Norte/AL, 31/01/1908 – Atenas/GR, 10/08/1951), como contrabaixista, tocava também violino, excursionando com ela pela Argentina em 1941 e Uruguai (Montevidéu), em 1953. Deixou registrado em disco o "Corridinho n. 100" e o choro "Aguenta a mão" em 1946. Faleceu no Rio de Janeiro, em 1967.
Do dobrado Temporada, houve também revisões feitas pelo maestro Bubu (em 1972 e 1980, quando foi acrescentada a parte de sax alto) e por mim, em maio de 1997, quando foram acrescentadas as partes de 3. clarinete, 3. piston, 3. trombone, 3. trompa, sax tenor, sax barítono e percussão. Este dobrado também é muito popular na cidade de Piranhas, para onde foi levado pelo maestro Afrânio (Bubu) em 1989 quando este assumiu os trabalhos na Escola de Música Mestre Elísio José de Souza (atual Filarmônica Mestre Elísio), refundada em fevereiro daquele ano.
Nesta nova edição, feita por Flávio Ventura e supervisionada por mim, foram eliminados erros e incoerências harmônicas que perduravam há quase 100 anos e foram negligenciados nas revisões anteriores; foram revisadas as partes acrescentadas em 1997 que não faziam parte da orquestração original de 1920 e outras, como sax alto, que foi acrescentada em 1980, e 1. Piston, foram finalmente reescritas respeitando sempre a estrutura original da antiga orquestração.
Ainda não nos foi possível descobrir a autoria deste dobrado assim como de tantos outros da mesma época. Assim sendo, estamos abertos a qualquer informação e cooperação com outras bandas de música do estado e do Brasil sobre esta e outras obras que nos leve a saber a sua verdadeira autoria para que se lance luz para as novas gerações sobre o que foi a música na região do Baixo São Francisco e no Estado de Alagoas.

São Paulo, fevereiro de 2018


Da tradição santanense: Temporada

Flávio Ventura

Em 1918, Capim, atual município alagoano de Olivença — na época parte do território de Santana do Ipanema —, tem organizada uma pequena banda de música com 15 instrumentos pertencentes aos próprios integrantes músicos, entre os quais, Amabílio[1] e Miguel Bulhões[2], Jonas Aragão[3], Pedrinho Preto e Jovino Azevedo[4].
Desde 1914, existia em Santana uma banda denominada Carapeba.
Notório foi o sucesso da banda da povoação Capim quando convidada para se apresentar na sede do município, em 1920.
Em 1922, sob a regência de Jovino Azevedo, é criada (com músicos também selecionados entre os componentes da banda de Capim) a Filarmônica Santanense, popularmente conhecida por “Aratanha”. Ambas, Aratanha e Carapeba coexistem com algum ranço de rivalidade e cessam atividades, respectivamente, em 1924 e 1926.
Só 9 anos depois remanescentes das duas bandas são reunidos, sob regência do maestro Abílio Mendonça (Floresta do Navio/PE, 02/06/1879 - Pão de Açúcar, 30/12/1963)[5], para formarem a Santa Cecília, logo após dirigida por Miguel Bulhões e, nos anos 1940, pelo jovem maestro José Ricardo Sobrinho, morto em consequências trágicas no carnaval de 1947, aos 28 anos.
Dessa tradição musical santanense sobreviveu-nos um dobrado, preservado no acervo da cidade de Pão de Açúcar (núcleo catalisador da atividade musical nesta parte do Baixo São Francisco) e na Mestre Elísio pela consequente atividade de mestres dessa cidade em Piranhas.
De autoria desconhecida, o dobrado Temporada resiste em cópias de P. Abreu e Jovino Azevedo datadas de junho de 1920, produzidas na povoação de Capim. Entre elas há ainda, da mesma época, uma cópia de parte para baixo sib feita em Pão de Açúcar por Américo Castro (1903-1967)[6].
No início dos anos 1990 com cópias e adaptações de Mestre Bubu[7] e cerca de 10 anos depois, data da última cópia renovada, foi regularmente praticado pela banda de Piranhas.
Este ano, no que seria o centenário da banda de Capim, apresentamos a primeira edição do dobrado Temporada. Edição recentemente revisada por Billy Magno[8] que em maio de 1997 já o havia revisto e ampliado.



Fontes:




[1] Amabílio Bulhões seguirá carreira de militar músico no Rio de Janeiro.
[2] Miguel Bulhões será maestro da Banda Santa Cecília, criada na década de 1930.
[3] Jonas Aragão se destacará nacionalmente. Falece no Peru.
[4] Apelidado Jovino “Sebança”.
[5] Natural de Floresta do Navio, Pernambuco, maestro Abílio Mendonça dirige bandas nas cidades de Neópolis/SE, Santana do Ipanema e Pão de Açúcar.
[6] Um dos irmãos músicos de mestre Nozinho (Manoel Vitorino Filho, 1895-1960), Américo, clarinete e violino, viria a ser contrabaixista da orquestra de Fon-Fon, no Rio de Janeiro.
[7] Afrânio Menezes Silva (1936-1991), maestro da Filarmônica Mestre Elísio no período 1989-1991.
[8] BILLY MAGNO nome artístico de Williams Magno Barbosa Fialho (Pão de Açúcar-AL 05/07/1978). Músico multi-instrumentista e arranjador. Na adolescência, foi estudar orquestração e regência em Salvador (BA). Iniciou na profissão em 1984 e teve como professores Paulo Henrique Lima Brandão (teoria), Petrúcio Ramos de Souza (orquestração e regência), Maria Mercedes Ribeiro Gomes (piano) e Edvaldo Gomes (contraponto), tendo ainda participado de Master Class de arranjo com Cristóvão Bastos, harmonia com Nelson Faria e trilha sonora com David Tygel. Dedicou-se, ao longo do tempo, à causa da música instrumental na qual tem atuado com mais frequência, trabalhando no Brasil e na Europa. Em junho de 2004, passa a viver em São Paulo. (http://abcdasalagoas.com.br/verbetes.php)